quinta-feira, 25 de janeiro de 1990

Velas que não se apagam

Sol que nem chega a nascer,
Névoa natural, cada dia mais distante,
Poeira do trabalho, cada vez mais trágica,
Tuas artérias expelem,
Entupidas de colesterol e CO²
A vida que dá e sobra
Para o resto deste enfermo corpo.
Luzes reais, cada uma um universo
Desta salada cultural.
Uma pinga, uma cerveja ou whisky
Não importa o poder aquisitivo
Todas chegam ao final do dia,
Para esquecer, afastar ou lembrar
Que amanhã tudo repete!
Doce rotina, repetir
Mesmos caminhos, mesmos semáforos;
Mas a cada dia um novo mendigo,
Uma nova gata, um novo assalto,
Uma nova morte;
Nada é igual a ontem,
Será diferente amanhã?
Fina fumaça, escura e hidrocor,
Tinge o poente de nuanças diferentes;
Destrói a Atlântica mata
E rasga a Paulista avenida
Numa solitária azaléia.
Rios sujos, para que outros não morram,
Bueiros entupidos, os demais escorrem?
Edifícios cinzentos, onde estão os coloridos?
Nada que aqui aconteça não espalha,
Talvez demore, que o tempo tem seu prazo,
Mas quando chega
Macunaíma derruba resistências
E se torna verdade.
Verdade uma só:
As coisas não acontecem apenas
Na esquina famosa,
Em cada beco, travessa ou ruela,
Um gemido
Som da vida ou do adeus
Não importa,
Sinais vitais que a cidade respire,
Apesar dos narizes empinados,
Apesar dos cabisbaixos,
Apesar dos apressados.
Querida cidade,
Te amo como és!

Edman
25/01/90 escrita em Gramado RS, para São Paulo SP